HONORÁRIOS 100% NA SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA

HONORÁRIOS 100% NA SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA

Com o advento do CPC/2015, a compensação dos honorários foi “expressamente” vedada (art. 85 § 14). Consolidou-se o entendimento que os honorários de sucumbência são de titularidade do advogado (terceiro), bem como suprimiu do “caput” do art. 86, a distribuição/divisão da verba honorária, “limitando-se o rateio” oriundo da sucumbência recíproca, somente das despesas.

                       O art. 86, CPC/2015: Se cada litigante for, em parte, vencedor e vencido, serão proporcionalmente distribuídas entre eles as despesas.

                       Parágrafo único. Se um litigante sucumbir em parte mínima do pedido, o outro responderá, por inteiro, pelas despesas e pelos honorários.

Se para a sucumbência recíproca a distribuição englobasse os termos “despesas” e “honorários” em uma relação de somatória, a conjunção aditiva certamente estaria expressa no caput do dispositivo, a exemplo da sucumbência mínima do parágrafo único, do mesmo artigo. A redação do texto não teria o ponto final após o termo “despesas”, mas sim o acréscimo da conjunção aditiva “e”. A frase então seria: “Distribuídas entre eles as despesas e os honorários advocatícios”.

A análise do art. 86, em todo o seu conjunto, deixa evidente que os termos “honorários” e “despesas” não se confundem. São elementos distintos e de natureza jurídica diversa. Preocupou-se o legislador em conceituar o termo “despesas” em dispositivo próprio, no art. 84 do CPC/2015, a saber:

                     Art. 84. As despesas abrangem as custas dos atos do processo, a indenização de viagem, a remuneração do assistente técnico e a diária de

                     testemunha.

O conceito de despesas é taxativo e, portanto, não se inclui os honorários advocatícios. Na sucumbência recíproca, as partes deverão ratear apenas as despesas, preservando os honorários advocatícios dos advogados de ambas as partes, em sua integralidade. Se A e B forem partes que sucumbiram na demanda, os honorários deverão ser pagos,  de forma cruzada, aos advogados do autor e do réu.

Assim, A rateará as despesas com B, mas terá que arcar com os honorários do advogado de B em sua “integralidade” e vice - versa. Os reflexos da sucumbência recíproca recaem tão somente às partes do processo, não podendo se estender esta divisão entre os advogados contrários e seus respectivos honorários. A distribuição da verba honorária não foi avocada pelo art. 86, “caput”, do CPC/2015. 

A distribuição proporcional das despesas só é possível porque neste caso existe a compatibilidade identitária entre os credores e devedores e que são ao mesmo tempo, entre si, vencedores e vencidos. A sucumbência recíproca não deve alcançar os honorários advocatícios simplesmente porque o advogado não é parte da demanda, sendo os honorários direito de um terceiro, na relação processual. 

O artigo 86, “caput”, do Código vigente, não reproduziu em sua íntegra o revogado art. 21 do CPC/73. Se a normativa anterior de 1973 atingia as despesas e os honorários advocatícios por força da sucumbência recíproca, o Código de Processo Civil de 2015 limitou o rateio entre as partes, somente das despesas. 

A proteção aos honorários advocatícios reforça a ideia de que a sucumbência recíproca recai sobre a parte que figura na relação processual. Se a sucumbência atinge a parte, não há sentido penalizar o advogado (terceiro) rateando sua verba honorária. Ao suprimir os honorários advocatícios, do “caput” do art. 86, pretendeu o legislador proteger tal verba alimentar em sua “totalidade”.  

Na lide processual, as obrigações possuem titulares diferentes. Se os honorários sucumbenciais são do advogado e não de seu cliente, a obrigação da qual o causídico é o credor (honorários) não pode ser compensada, nem dividida, nem rateada, pois é obrigação diversa em relação à obrigação pela qual o seu cliente está vinculado (objeto da disputa processual).  

Para Streck (2014b, p. 174), “respeitar os limites semânticos do texto constitucional significa combater a discricionariedade, o ativismo, o positivismo fático etc. que, como se sabe são algumas das várias faces do subjetivismo”. Ancorado em Friedrich Müller, Streck (2014b, p. 175) descreve que “o texto normativo determinará os extremos de possíveis variantes de significado, assegurando, pois, os limites necessários ao intérprete”. 

O art. 86, “caput”, corresponde a uma lei válida e originada de um parlamento democrático. Sua aplicabilidade aos moldes do que prevê seu sentido hermenêutico é medida necessária. Não se questiona, cumpra-se a lei, pois “em uma democracia é desejável que se cumpram os limites semântico-hermenêuticos de um texto legal” (STRECK, 2020).

A jurisprudência majoritária ainda encontra-se “aprisionada”, ao entendimento do revogado art. 21 do CPC de 1973, até porque o art. 86, “caput”, até hoje não é aplicado como deveria ser pela maioria dos tribunais. O “caput” do art. 86, “não se trata de uma cópia” do revogado art. 21 do CPC/73.

Como o art. 21, lá em 1973, admitia-se a compensação dos honorários, atualmente com a proibição da compensação (art. 85, § 14), o rateio da verba alimentar passou a ser tolerado por parte dos operadores do direito. Ocorre que é necessário refutar este realismo jurídico, dominante, em nossos tribunais. Não deve o operador do direito estar em “busca de qualquer coisa”, mas em busca da “resposta correta”, idealizada por Dworkin.  


REFERÊNCIAS:

STRECK, Lenio Luiz. Os limites semânticos e sua importância na e para a democracia. Revista da AJURIS,  v. 41, n. 135, p.173-187, Set. 2014b.

_______________A literalidade e a falsa disputa entre letra e além da letra. Site Conjur Jurídico. 10 dez. de 2020. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2020-dez-10/senso-incomum-literalidade-falsa-disputa-entre-letra-alem-letra. Acessado em 10 de Dezembro de 2020.

LEI nº 13.105 de 16 de Março de 2015 (Código de Processo Civil).

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